8 de março de 2023

O Mar dos Outros

O Mar dos Outros é feito de marés sem tumultos,
Ventos que sopram levemente, gaivotas a voar,
Embarcações sem fantasmas ou vultos
Daqueles que embarcaram mas não puderam retornar.

Tem o cheiro a maresia, o som das medusas a flutuarem,
Tem o cantar milenar no seu imponente ondular.
É-lhe sempre próxima a terra, o farol para o encontrarem,
Sob o seu céu há sempre a estrela para o guiar.

O Mar dos Outros sempre parecera menos tempestuoso,
Com a crina brilhante, o ondular leve e manso,
Sempre mais altivo no seu dançar, mais glorioso.

Com o rebentar na costa sempre miúdo e pausado,
Tão forte e imponente no seu balanço
Mas sei eu agora que os grandes marinheiros não se fazem em mar calmo.

Dedicado à Dra. Liliana Carvalho

As Mulheres do Mar

Por entre os longos estendais, debaixo do sol a raiar,
Caminhavam as viúvas, as mães, as jovens acabadas de casar
A quem os sonhos eram sempre distantes,
Cuja voz rouca e afinada cantava as saudades dos seus valentes amantes.
 
Os lenços pretos escondiam as nuances dos cabelos salgados,
A sua melancolia era impregnada nas escamas ao sol estendidas.
Eram a elas guardados os duros fados
Que se seguiam às longas viagens percorridas.
 
Caminhavam descalças sobre a terra batida,
De cesto à cabeça, com as costas rijas como o bacalhau seco à luz do dia.
Tinham a pele da face queimada pelo toque e cheiro da agreste maresia.
 
Ficara a sua valentia em Ílhavo conhecida
Como aquele velho tempo que jamais irá voltar
Pois agora jazem eternamente em terra as bravas Mulheres do Mar.